![]() |
Por Pedro Luiz Pozza,
juiz de Direito no RS
As palavras do ministro
Gilmar Mendes, do STF, durante manifestação acerca do foro privilegiado para
autoridades, no sentido de que a justiça de primeira instância não funciona,
devem ser repudiadas de forma veemente.
Infelizmente, tem sido comum que altas
autoridades do Poder Judiciário critiquem os juízes de primeiro e segundo graus,
sendo essa, aliás, uma das maiores ´justificativas´ pelos quais defendem uma
atuação ampla do Conselho Nacional de Justiça.
Os próprios juízes brasileiros reconhecem que a
justiça não funciona como deveria. Isso, entretanto, não é culpa dos
magistrados, salvo exceções, não sendo todos vagabundos, como sustenta a
ministra Eliana Calmon, corregedora do CNJ. Ao contrário, a maioria trabalha, e
muito.
Ademais, o STF não tem
moral para criticar a justiça de primeiro grau, quando são aos milhares os
processos que tramitam na mais alta corte brasileira que duram 20, 30 e 40 anos,
e alguns até mais.
Basta ver as
pautas divulgadas pelo STF para suas sessões plenárias. Na sessão de 1º de
março, por exemplo, um dos processos pautados (Ação Cível Originária nº 79) tem
mais de 50 anos de tramitação (foi ajuizada em 17.06.1959), e ainda assim não
foi julgada.
Outro processo – ADI
nº 807, da relatoria do Ministro Dias Toffoli - foi ajuizado em 24.11.1992. E
ainda assim o julgamento não foi concluído, pois a ministra Rosa Weber pediu
vista.
O próprio ministro Gilmar
Mendes é relator de uma ADI (nº 803) que foi ajuizada em 26.11.1992, e até hoje
não foi colocada em pauta.
Além
disso, o STF é extremamente benevolente com as autoridades que têm foro
privilegiado, pois até hoje poucos foram os parlamentares condenados por crimes
cometidos. E quando há condenação, no mais das vezes as penas estão fulminadas
pela prescrição.
Bastaria que o
STF fosse mais rigoroso com os detentores de foro privilegiado, condenando
rapidamente aqueles que realmente devem ser punidos; assim os próprios
parlamentares mudariam a Constituição para extinguir essa excrecência jurídica,
pois ao menos teriam mais chances se processados pela justiça de primeiro grau,
que - como disse o ministro Gilmar - não funciona.
Lógico, o STF, quando quer, é extremamente
rápido, especialmente quando seus julgamentos são de interesse da opinião
pública, e dão audiência, assim ocorreu com a decisão sobre as uniões homo
afetivas, Lei da Ficha Limpa etc.
Também foi extremamente rápido o STF para
julgar (e arquivar, obviamente), as ações de improbidade em que era réu o
próprio ministro Gilmar Mendes, por ocasião de sua ascensão à presidência da
corte, e que diziam respeito a atos praticados por ele quando à testa da
Advocacia-Geral da União.
Dessas
ações, aliás, nem registro há no saite do STF, devendo estar ao abrigo do
segredo de justiça.
Infelizmente,
basta assistir a uma sessão do plenário do STF para verificar que ali o que mais
impera, infelizmente, é a vaidade, pois a despeito de os ministros estarem ´de
acordo com o voto do relator´, ficam a tecer longas considerações sobre seus
posicionamentos, com isso desperdiçando um tempo precioso que poderia ser
dedicado ao julgamento dos milhares de outros processos que esperam por decisão
nos escaninhos de seus gabinetes.
O lamentável é que essas críticas generalizadas
ao Poder Judiciário vêm de que não tem experiência para fazê-las.
Infelizmente, a maioria dos que chegam à mais
alta corte de Justiça do país não são juízes de carreira, e que nunca tiveram de
trabalhar sem qualquer estrutura, sem assessoria, sem computadores etc., como
faz a grande maioria dos juízes brasileiros no primeiro grau, cuja estrutura,
salvo exceções, ainda é a do século XIX (nem ao menos chegamos ao século XX em
alguns rincões deste país).
É
muito fácil a quem nunca foi juiz de carreira, que nunca enfrentou as grandes
dificuldades que enfrentam os verdadeiros heróis do Poder Judiciário, falar mal
do desempenho da justiça de primeiro grau.
Portanto, senhor ministro Gilmar Mendes,
respeite os juízes brasileiros!
.........................
Notas do editor
* A ação
nº 803 teve como primeiro relator o ministro Octavio Gallotti (11.11.92); depois
foi redistribuída ao ministro Sydney Sanchez (05.05.1994); seu terceiro relator
foi o ministro Cesar Peluso (26.06.2003); o quarto relator é o ministro Gilmar
Mendes (24.04.2010).
* A ação nº 807 teve como primeiro relator o
ministro Celso de Mello (24.11.1992); depois foi redistribuída ao ministro
Sepúlveda Pertence (21.05.2002); o terceiro relator foi o ministro Menezes
Direito (10.09.2007); o quarto foi o ministro Dias Toffoli (18.12.2009); foi
levada a julgamento em 1º de março de 2002; nessa ocasião houve o pedido de
vista.
* Para verificar a tramitação da ação que já tem 52 anos de
existência, sugere-se ao leitor que clique aqui.
Fonte: Espaço Vital - do dia 05/03/2012
http://www.espacovital.com.br/noticia_ler.php?id=26723&lat=1
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Deixe aqui o seu comentário. Obrigada.